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Tempos de eleição no Brasil: Doações Eleitorais e Compliance Anticorrupção

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Por Carlos Ayres*

Doações eleitorais no Brasil são muitas vezes uma área de preocupação sob o ponto de vista de compliance anticorrupção. Conforme destacado por Lucio Rennó, Professor do Programa sobre as Américas da Universidade de Brasília, no livro Corruption and Democracy in Brazil: The Struggle for Accountability, “é impossível compreender a eleição brasileira, sem considerar o impacto da corrupção.”

Dado que o Brasil está agora em época de eleição (as eleições para o Senado, Câmara dos Deputados, Assembleias Legislativas estaduais ocorreram em 5 de outubro e o segundo turno das eleições para presidente e governador em alguns Estados ocorre em 26 de outubro), este post fornece uma lista de áreas que o profissional de compliance deve levar em consideração no que diz respeito às doações eleitorais.

Atenção para a legislação local. A legislação local limita as doações eleitorais de empresas a 2% da receita bruta (ou, para os indivíduos, 10% de sua renda) do ano imediatamente anterior à eleição. Aquele que fizer uma doação eleitoral superior a esse limite está sujeito a uma multa de 5 a 10 vezes o montante do excesso e proibição de contratar com a administração pública por até 5 anos. Os doadores devem manter um recibo apropriado emitido pelos candidatos ou partido político dando suporte a qualquer doação. Muitas vezes, os problemas podem surgir com base em doações eleitorais “não oficiais”.

Não é apenas sobre os limites financeiros e recibos. Muitas pessoas pensam que, desde que as doações eleitorais da empresa estejam dentro de limites legais e tenham sido obtidos os recibos apropriados, nenhuma responsabilidade poderia ser atribuída. Mas a existência de um quid pro quo relacionado com a doação eleitoral também pode fazer com que a empresa entre em conflito com as leis anticorrupção. Durante um due diligence anticorrupção, por exemplo, não é incomum descobrir que um terceiro ou uma empresa target em uma operação de fusão ou aquisição (conhecido pela sigla M&A, do inglês, merge and acquisition) tenha feito doação em troca de um benefício. Por exemplo, um prefeito poderia desapropriar uma determinada área e fornecê-la para ser usada por uma empresa doadora.

Atenção para o montante da doação. Além de garantir que a contribuição se enquadre no limite adequado, que um recibo tenha sido obtido e não houve nenhum quid pro quo, as empresas também devem se certificar que a sua doação é razoável e proporcional. A doação não deve criar a aparência de influência indevida. O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social publicou recentemente uma análise abrangente de doações eleitorais no Brasil intitulado A responsabilidade das empresas no processo eleitoral. O relatório revelou que, nas eleições de 2010 (as últimas eleições federais), os 10 maiores contribuintes (pessoas jurídicas) fizeram doações eleitorais no total de aproximadamente R$ 519 milhões (cerca de U$ 308 milhões, pela taxa de câmbio de 1º de outubro de 2014). A análise também constatou que os principais doadores frequentemente fazem doações para diferentes partidos e candidatos, mesmo para aqueles que têm diferentes agendas políticas. Os riscos de compliance sobem quando valores de doações são elevados e as justificativas são questionáveis.

Ter uma política escrita de doações. Diante dos riscos associados com as doações eleitorais, muitas empresas que operam no Brasil optam por proibi-las. De acordo com uma pesquisa realizada também pelo Instituto Ethos com os signatários do seu Pacto Empresarial pela Integridade e Contra a Corrupção, 82,6% das entidades pesquisadas não fizeram contribuições políticas nas eleições de 2010 e 2012 e 58,7% do número total de participantes tinham políticas escritas vigentes proibindo doações eleitorais. Se uma empresa opta por fazer doações eleitorais, para mitigar o risco, deve ter uma política escrita, estabelecendo os critérios e limites para as doações. Ela deve exigir que a empresa documente a doação de maneira racional e pré-aprovada através de canais corporativos adequados.

Esteja pronto para explicar as suas doações. A grande maioria das informações relacionadas com as doações eleitorais estão disponíveis ao público na Internet. Em poucos cliques, qualquer um pode verificar quem tem contribuído para candidatos ou partidos específicos (para as eleições de 2014, essa informação pode ser obtida aqui). Devido a isso, as doações eleitorais são frequentemente sujeitas a intenso escrutínio da mídia, da sociedade civil e autoridades governamentais. Recentemente, autoridades federais declararam publicamente que o regulamento federal sobre programas de compliance anticorrupção vai incluir a transparência nas doações eleitorais como um elemento de um programa efetivo (não está claro quais medidas serão necessárias para cumprir este requisito).

Também deve ser ressaltado que o futuro das doações eleitorais no Brasil é incerto. Existe agora um caso pendente no Supremo Tribunal Federal que pode determinar se as empresas poderão ou não continuar fazendo doações eleitorais (até agora, a maioria dos ministros votou a favor da proibição). Há também um projeto de lei pendente no Congresso que proíbe doações eleitorais por empresas. O profissional de compliance deve se manter atualizado com o desenrolar desses fatos.

*Carlos Ayres é advogado do grupo de compliance do escritório Trench, Rossi e Watanabe Advogados, Coordenador da Comissão Anticorrupção e Compliance do Instituto Brasileiro de Direito Empresarial (IBRADEMP).

A versão original deste texto foi escrita em inglês e publicado no blog FCPAmérica. A tradução não foi realizada pelo autor.

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